‘Extras’ elevam ganhos em até R$ 286 mil de procuradores

Aras abriu edital permitindo que procuradores solicitassem, de uma só vez, o recebimento

Os procuradores do Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte (MPF-RN) receberam R$ 1,3 milhão somente em verbas indenizatórias no mês de dezembro de 2021.  Os valores variaram entre R$ 1,8 mil e R$ 286 mil. Os pagamentos não são ilegais e são justificados pela Procuradoria Geral da República (PGR) como quitação de dívidas da União para com membros do MPF, tais como licença-prêmio, abonos e indenizações de férias não usufruídas. Situação semelhante ocorreu também no Ministério Público estadual, onde as verbas indenizatórias para promotores e procuradores do parquet somaram R$ 6,3 milhões, visto que o número de membros do órgão estadual é maior.

O salário mensal dos procuradores e promotores é instituído de forma e valores semelhantes ao dos juízes e desembargadores, que também têm direito a esse tipo de indenização que, eventualmente, eleva os salários superando o teto do funcionalismo, que é de R$ 39.293,32 (equivalente a 1 salário de ministro do Supremo Tribunal Federal).

De acordo com o portal da transparência do Ministério Público Federal, um procurador da República recebe um salário mensal de R$ 33.689,11, o que representa quase 28 salários mínimos atuais. O salário mínimo é a remuneração mensal de um terço da população brasileira que trabalha formalmente, segundo estudo da Consultoria IDados com base na Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílio (Pnad) do IBGE.

Somado a este salário, 19 procuradores do MPF-RN tiveram direito às verbas indenizatórias que somaram R$ 1.368.628,50, com valores individuais que variaram entre R$ 1.820,16 e R$ 286.680,30.  Cinco deles receberam recursos dessa natureza acima dos R$ 100 mil e apenas quatro dispuseram de valores abaixo de R$ 10 mil em recursos extra.

A procuradoria Geral da República (PGR) emitiu uma nota de esclarecimento explicando que se trata de “pagamentos excepcionais feitos a membros do Ministério Público Federal na folha de dezembro de 2021”. A nota diz que o procurador-geral da República, Augusto Aras, cumpriu decisões judiciais e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) anteriores à sua gestão, que começou em setembro de 2019. A justificativa é de que se trata da quitação de dívidas da União para com membros do MPF, referentes a licença-prêmio, abonos e indenizações de férias não usufruídas.

Dessa forma, Aras abriu edital permitindo que procuradores solicitassem, de uma só vez, o recebimento em dinheiro dos benefícios atrasados. Com a autorização, quem tinha folgas acumuladas ou licença-prêmio teve a autorização para converter esses dias em dinheiro pago no contracheque de dezembro. Além disso, em outra portaria de dezembro passado, o PGR também liberou o pagamento antecipado das férias deste ano.

A nota de esclarecimento destaca que parte dessas dívidas é antiga (algumas da década de 1990) e foi reconhecida por decisões judiciais, que determinaram a respectiva quitação. “Referem-se, portanto, a direitos previstos em lei, reconhecidos e disciplinados pelos órgãos superiores e de controle, caso do CNMP. Todos os valores pagos pelo MPF a seus membros atendem os princípios da legalidade e da transparência, tanto que estão disponíveis para escrutínio de qualquer cidadão no portal da instituição (http://www.transparencia.mpf.mp.br/)”, destaca.

Todas as etapas administrativas exigidas, incluindo a publicação prévia de editais e portarias para disciplinar o desembolso, foram cumpridas, segundo a PGR. Além disso, a instituição explicou que a aplicação do teto constitucional às despesas de caráter remuneratório e indenizatório segue o disposto na Resolução CNMP nº 9 , de 5 de junho de 2006, sendo integralmente respeitada em todos os pagamentos feitos em dezembro.

“A folha de dezembro de 2021 apresenta valores maiores do que a média de outros meses, inclusive em razão de pagamentos obrigatórios efetivados sempre nessa época do ano, como parcela de 13º salário devida a membros e servidores. Os adiantamentos feitos – antecipação de férias de 2022 e de auxílio alimentação de janeiro – observam critérios técnicos de gestão administrativa e têm o objetivo de garantir a integral execução orçamentária, inclusive no sentido de se evitar a rolagem de dívidas para exercícios futuros”, esclarece a nota.

MP-RN pagou R$ 6,3 milhões

Os promotores e procuradores do Ministério Público Estadual (MPRN) também puderam desfrutar das verbas indenizatórias de que tinham direito. Estas aumentaram a folha do órgão em R$ 6.338.810,60 em dezembro.

Um promotor de terceira entrância no RN recebe uma remuneração igual a dos procuradores federais (R$ 33,6 mil). Já o promotor em segunda entrância ganha R$ 32.004,64 por mês e na primeira entrância eles recebem R$ 30.404,42. Já um procurador de justiça do MPRN recebe um salário bruto mensal de R$ 35.462,22. Com os acréscimos eventuais, a renda bruta deles pode chegar a R$ 219.315,02 como ocorreu em dezembro com um dos promotores de terceira entrância.

Neste mesmo mês, dos 237 membros do MPRN que aparecem na folha entre promotores e procuradores, 34 não fizeram jus à verba indenizatória autorizada pela Procuradoria Geral da República. Apenas um promotor substituto recebeu R$ 1,8 mil e o restante teve direito a valores acima de R$ 11 mil somente em verbas indenizatórias.  A maioria dos que teve direito aos recursos extra recebeu R$ 30 mil, porém, há casos de R$ 89,8 mil e de R$ 148,6 mil, como ocorreu com promotores de terceira entrância.

Nenhum daqueles que tiveram as verbas indenizatórias de dezembro somadas aos salários receberam menos do que R$ 42 mil em salário líquido. Três promotores de terceira entrância e um promotor substituto tiveram disponíveis em suas contas mais de R$ 100 mil, um deles usufruiu de um salário líquido de R$ 195 mil.

A TRIBUNA DO NORTE não conseguiu contato com a Associação do Ministério Público do Rio Grande do Norte (Ampern) para que a entidade se manifestasse sobre o assunto e o MPRN também não apresentou nenhum posicionamento, apesar de ter sido procurado.

Associação nega desrespeito ao teto salarial

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) também se manifestou e garantiu “a lisura, legalidade, transparência e oportunidade dos respectivos atos assinados pelo procurador-geral da República”, nesses pagamentos. A entidade reforçou os argumentos da PGR e ressaltou que os pagamentos constituem direitos adquiridos, reconhecidos judicialmente e que, embora altos, os valores não confrontam o teto salarial do funcionalismo.

“A ANPR repudia qualquer tentativa de relacionar os pagamentos, de caráter excepcional, a um suposto desrespeito à regra do teto remuneratório, estabelecida pela Constituição Federal. Os valores incluem dívidas e direitos esporádicos como licenças-prêmio, Parcela Autônoma de Equivalência (PAE), além de abonos e indenizações de férias (não usufruídas), sendo alguns desses pendentes desde a década de 1990. Jamais significam, portanto, penduricalhos à remuneração mensal de procuradores e procuradoras”, divulgou a associação.

“Reafirmamos, desta forma, a lisura dos atos assinados pelo procurador-geral da República que resultaram na quitação de dívidas e direitos, bem como a observância aos princípios da legalidade, transparência e oportunidade”, concluiu e entidade.

NOTA

O Ministério Público do RN enviou ontem à noite a seguinte nota sobre os valores pagos a promotores e procuradores de Justiça do Estado:

“Os valores são decorrentes de indenizações e outras parcelas salariais expressamente previstas em lei, não pagas na época devida a procuradores e promotores de justiça, mas que posteriormente foram reconhecidas administrativa e judicialmente, inclusive por sentenças com trânsito em julgado, após decisões confirmatórias prolatadas pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, tudo com observância de critérios de legalidade e transparência.

Os pagamentos foram realizados a partir de acordos, que foram celebrados apenas com os interessados que aderiram às condições impostas, dentre as quais a renúncia a parcela significativa da dívida, o que permitiu uma economia de recursos da ordem de 40% do montante do débito, isso sem considerar outros custos adicionais de natureza processual, igualmente impactantes, que poderiam ser acrescidos no caso de não ser implementada a amortização consensual da pendência.

O Ministério Público reafirma o dever de publicidade, informando que os valores pagos individualmente podem ser consultados em fonte aberta no endereço eletrônico www.mprn.mp.br, onde estão hospedados dados de transparência integralmente alinhados à Lei de Acesso à Informação e às normativas do Conselho Nacional do Ministério Público.”

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